Em Chiang Mai, região Norte da Tailândia, tivemos o nosso primeiro contato com as mulheres “Long Neck” ou pescoço de girafa, remanescentes dessa cultura ainda presente em alguns países do sudeste asiático como a Tailândia, Laos e Myanmar (ex-Birmânia).
Logo que chegamos na aldeia já fomos surpreendidos por 2 ou 3 mulheres passando de um lado para o outro, revelando a beleza e elegância de seus movimentos que se assemelham ao caminhar lento e ereto das girafas, por isso a origem do nome. Todas carregavam nos pescoços e pernas as tradicionais argolas que chegam a pesar 20 kg (pescoço e pernas). Os adornos começam a ser colocados nas mulheres à partir dos 5 anos de idade e trocados a cada 2 anos.
Ao contrário do que possa parecer, não são várias argolas e sim um fio continuo. Na cerimonia de troca remove-se o anterior para dar lugar a uma nova espiral maior ainda. Muitos pensam que o pescoço dessas mulheres cresce com o tempo, mas a verdade é que com o peso do metal, a clavícula cede e 4 vértebras da coluna passam a incorporar o pescoço. Com o passar do tempo as argolas presas às pernas também afinam os membros devido à pressão.
Existem muitas teorias que envolvem o surgimento dessa cultura que vão desde uma simples peculiaridade estética e tribal que passa de geração para geração, até a explicação pautada na proteção dos pescoços contra uma eventual mordida de tigre. As vertentes são múltiplas e acho que nem as próprias descendentes conseguem explicar de fato a origem de seus adornos.
Hoje muitas das tribos abertas à visitação são “fabricadas” para nós turistas… triste informação, mas é a mais pura verdade. As mulheres são trazidas de suas tribos originais e em troca de dinheiro “desfilam” numa aldeia construída para nós, gringos.
Muitas também vem de regiões de conflito da ex-Birmânia e acabam se acomodando na pacífica Tailândia em troca de água e terra cedidas pelo governo tailandês, mantendo-se através da venda de artigos típicos.
A história parece até bonita salvo pelo fato de que são praticamente prisioneiras desse sistema. Essa tribo que visitamos por exemplo é recheada de crianças, mas somente os meninos tem o direito a escola, as meninas são obrigadas a permanecer na tribo e fazerem parte da vitrine-viva se expondo para nós turistas famintos por fotos.
Com um olhar mais apurado pode-se perceber o mal estar que paira entre “long necks” das mais diversas idades que parecem no limite da tolerância desse sistema “mercantil”, é como se estivéssemos ali roubando suas almas a cada clique, mas infelizmente essa é parte que dá lucro nesse jogo de interesses. Dificilmente encontramos alguma das mulheres mostrando com prazer a sua cultura, felizes por sua origem étnica. Ao contrário, hoje a única coisa que tem para mostrar são seus belos ornamentos. Não vimos dança, pintura, música, culinária, nada que nos possibilitasse reter mais conhecimento.
Registrei muitos momentos dessas mulheres duelando com seus pescoços de ouro, incomodadas pela pressão do ornamento num calor de rachar: metal + 37 graus realmente não é uma combinação muito confortável!!
A dúvida que paira no ar é até que ponto esse é um traço cultural legítimo, valorizado e consagrado ou um flagelo; uma prisão em forma de adorno…
Tenho me questionado muito a respeito do Hijab (vestimenta das mulheres muçulmanas), das feridas e incisões feitas como adorno nas mulheres de certas tribos da África, dos véus, dos alargadores dos lóbulos de orelha, não sei sinceramente até que ponto a perpetuação desses hábitos é um questão cultural e religiosa ou uma tradução do mais puro terrorismo psicológico enfrentado pelas mulheres, disfarçado em nome de uma crença.
Quanto as mulheres long neck muitos optam pela resposta “vaidade” como argumento de escolha dessa “prisão”, o fato é que mantê-las numa vida tribal sem contato com o meio externo facilita a administração e perpetuação desse rito, se fossem miscigenadas não sei o que realmente restaria dos pesados adornos…
E nós mulheres viventes de um mundo ocidental, globalizado e liberto, será que não estamos também entrando num “outro” modus vivendi mas que também bebe nessa fonte da clausura em nome da vaidade??!! A utopia que tem se criado me nome da eternização da beleza não veio também para nos crucificar?! Não sei se nós, e eu me incluo nisso, também não estamos caminhando para essa outra espécie de clausura, mas em pleno século 21!!
Você já questionou o tamanho de sua vaidade hoje??!!
Por Luah Galvão
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